Crianças e o Cárcere: efeitos do sistema prisional no desenvolvimento da primeira infância
Este relatório destaca a importância da intersetorialidade para a reflexão de políticas penitenciárias no Brasil. A criminalização de mulheres tem aumentado exponencialmente nos últimos 15 anos, e o impacto desta política penitenciária é analisado, nesta pesquisa, na perspectiva do desenvolvimento da primeira infância. A insalubridade dos cárceres é diametralmente oposta às necessidades de desenvolvimento de uma criança em seus primeiros anos e, para tanto, a pesquisa analisou as condições das Unidades Materno Infantis de 5 cidades de regiões diferentes do Brasil e as políticas públicas de educação, saúde e assistência social disponíveis à proteção da primeira infância que transita pelo cárcere. Os resultados indicam que a proteção à primeira infância é mais intensa quando há a interlocução entre diversas políticas públicas, e quando as medidas descarcerizantes são acompanhadas de diálogo, escuta e cuidado.
O encarceramento de mulheres é tema que vem recebendo, cada vez mais, atenção da literatura e das pesquisas em Direito, especialmente nos últimos vinte anos. O aumento da população carcerária feminina, especialmente em razão da criminalização secundária em torno do tráfico de drogas, ou a solidão das mulheres no cárcere, como resposta duplamente punitiva, são temas relativamente recorrentes nos campos criminológico e penal. Porém, uma interseção tem tomado mais destaque entre juristas, sociólogas, antropólogas e demais profissionais das ciências sociais: a relação entre cárcere, maternidade e a atuação do Estado na proteção à primeira infância
A pesquisa, realizada entre fevereiro e dezembro de 2019, aponta alguns caminhos para novas pesquisas sobre a relação entre primeira infância e cárcere e, sobretudo, para ações institucionais, a necessidade de avanço no sentido de se conceituar melhor os limites da prisão domiciliar para gestantes e mães, sempre em interlocução com as redes de proteção social, para que uma política criminal de cunho descarcerizante10 seja associada ao reforço de políticas públicas inclusivas e protetoras da primeira infância.
Assim, como toda pesquisa empírica em Direito, os dados aqui apresentados trazem mais perguntas do que respostas. Como mais uma das pesquisas em prisão, é importante dizer, desde já, que os resultados de cada campo de pesquisa não são “comparáveis” entre si, uma vez que as realidades do sistema prisional, em cada Unidade Federativa do Brasil, são muito diversas. A intenção da presente pesquisa não é oferecer um modelo aplicado de intervenção, mas iniciar a investigação em torno de possíveis chaves para novas pesquisas e para ações de sensibilização a determinados atores do sistema de justiça, sobretudo o criminal. Porém, é a diversidade a maior riqueza da pesquisa: nos campos, ocorreram discussões sobre o papel da prisão em um contexto de proteção à primeira infância, bem como sobre a necessidade de se debater o cabimento da prisão domiciliar em cada contexto, de acordo com as normas internacionais e internas sobre a questão.